AMERICAN NINJA (1985) CLÁSSICOS SESSÃO DA TARDE
American Ninja (1985, EUA) - Direção: Sam Firstenberg - Elenco: Michael Dudikoff, Steve James, Tadashi Yamashita, Judie Aronson, Guich Koock, John Fujioka, Don Stewart, John LaMotta, Phil Brock e Manolet Escudero.
ANTES QUE ALGUÉM SURTE, VOU EXPLICAR: AMERICAN NINJA CLÁSSICO??? ENTÃO...
para a geração dos anos 80, qualquer filme dos mestres de ação é um clássico;
KOBA DERA
Você certamente já viu AMERICAN NINJA numa das incontáveis reprises do filme pela Globo, ou pelo menos ouviu falar do que se tratava graças aos comerciais das tais incontáveis reprises. Você certamente sabe que esta bem-sucedida aventura ocidental sobre ninjas deu origem a uma nem tão bem-sucedida franquia, com direito a quatro continuações. Mas você sabia que AMERICAN NINJA só existe porque o público não estava preparado para ver uma ninja-menina?
Acredite se quiser, mas a gênese dessa aventura produzida pela lendária Cannon Films foi a bilheteria abaixo do esperado de um filme anterior dos mesmos realizadores, "Ninja III - A Dominação" (1984), terceiro e último capítulo de uma série iniciada com "Ninja, A Máquina Assassina" - aquele estrelado pelo italiano Franco Nero!
Como os outros filmes de ninja produzidos pela Cannon tinham rendido um dinheirão, e como "Ninja III" trazia uma ninja-menina (interpretada pela gata Lucinda Dickey) e rendeu menos, os produtores machistas alegaram que o sexo da personagem era o motivo da bilheteria reduzida, exigindo que o diretor Sam Firstenberg colocasse um ninja-menino em sua próxima produção do gênero. Pronto: nasceu AMERICAN NINJA.
O que pouca gente sabe, também, é que por volta de 1984 o projeto seria dirigido por Joseph Zito e estrelado por Chuck Norris, já que os dois tinham feito uma parceira bem-sucedida em "Braddock - O Super Comando".
Anúncios divulgando a produção com os nomes de ambos chegaram a ser publicados (veja ao lado), mas Zito e seu astro pularam fora logo depois - o orçamento inteiro do filme era menor que o salário de Norris, dizem as más línguas.
Assim, o barateiro Firstenberg assumiu e os produtores pediram que ele encontrasse um ator jovem que fosse boa-pinta e "parecido com James Dean" para o papel principal.
Foi quando subiu a bordo do projeto um loirinho com cara de surfista chamado Michael Dudikoff, que não lutava porcaria nenhuma e nem tinha pinta de herói de ação (antes, seu papel de mais destaque foi como um dos amigos tarados de Tom Hanks na comédia "A Última Festa de Solteiro").
Ora, e o que importa se Dudikoff não sabia lutar? O importante é que ele era boa-pinta e parecia James Dean, como os produtores queriam. Além disso, Franco Nero também não sabia lutar e estrelou "Ninja, A Máquina Assassina". Por sinal, a solução encontrada nos dois filmes foi a mesma: substituir o astro (tanto Dudikoff quanto Nero) pelo coreógrafo das cenas de ação Mike Stone nas cenas mais "delicadas". Afinal, o sujeito estaria escondido atrás da roupa de ninja mesmo!
E não é que convenceu? Tanto que a primeira vez que vi AMERICAN NINJA, ainda molecão, jurava que Michael Dudikoff lutava bem pra caramba. Claro, isso foi antes de perceber que as "lutas" com o sujeito eram beneficiadas pela montagem e pelos planos de detalhe, quando fica fácil substituir o galã que não sabe lutar pelo dublê que sabe. Ah, a magia do cinema...
Mas quer saber? Não importa se o astro não sabe lutar, e sim que AMERICAN NINJA funciona que é uma beleza. Revi o filme recentemente e até achei melhor do que eu me lembrava - principalmente considerando o fator trash da coisa toda, que torna o programa ainda mais divertido.
Dudikoff interpreta Joe T. Armstrong, o novo e misterioso recruta de um destacamento militar norte-americano nas Filipinas. Carregamentos de armamentos e munições estão sendo roubados com frequência do quartel, e o responsável é um traficante de armas da região, Victor Ortega (Don Stewart), que vende a muamba para ditaduras de todas as partes do globo.
Certo dia, o carregamento que está sendo escoltado pelo soldado Armstrong cai numa emboscada. Só que, além de armas, o comboio leva também Patricia (Judie Aronson), a bela filha do comandante da base. Temendo pela segurança da moça, o herói reage contra os ladrões e mostra ser bom de briga. Mas logo uns guerreiros ninja de uniforme preto aparecem do nada e atacam os soldados. Armstrong foge com a garota, mas seus companheiros são todos chacinados pelos misteriosos atacantes.
Apesar de ter salvado a filha do general, Joe atrai a inimizade dos seus colegas de farda porque sua reação resultou na morte de diversos soldados. E quando o vilão Ortega exige a cabeça do herói, para poder continuar com seus roubos de armas sem maiores problemas, o "ninja americano" precisa unir-se ao cabo Jackson (Steve James), que também é bom de briga, para enfrentar os ataques dos bandidos.
O roteiro redondinho de AMERICAN NINJA foi escrito por Paul De Mielche, e surpreendentemente este é o seu único crédito no ramo. James R. Silke, que havia assinado os roteiros de "A Vingança do Ninja" e "Ninja III" para a Cannon, foi chamado para fazer algumas adaptações no material, mas sem receber crédito.
Uma das grandes qualidades do filme é que ele oferece um bocado de cenas de ação sem grandes exageros ou façanhas físicas absurdas, mas numa quantidade tão grande e frequente que não permite que o espectador pense muito no que está acontecendo (o ataque ao comboio do exército e o primeiro confronto do herói com os ninjas acontece já nos primeiros 10 minutos!).
As lutas em si não têm nada de tão espetacular, embora rápidas e bem coreografadas. Quem rouba a cena é o ninja preto inimigo, interpretado por Tadashi Yamashita (que já havia enfrentado Chuck Norris em "Octagon").
Yamashita realmente consegue passar a imagem de um ninja invencível e ameaçador, e convence o espectador de que pode, por exemplo, invadir uma base militar deixando uma trilha de cadáveres.
Seu confronto final com o "american ninja" é muito bem filmado e envolvente, já que o vilão usa todas as armas e truques ninja à sua disposição - e até alguns truques sujos que não são bem coisa de ninja, como o disparo de um inexplicável raio laser (???). Sem querer estragar a surpresa sobre quem vive e quem morre no duelo final, Joe Armstrong voltou nas Partes 2 e 4...
Também há pelo menos três momentos bem dirigidos envolvendo o herói às voltas com carros em movimento. Num deles, parecido com cena clássica de "Os Caçadores da Arca Perdida", Armstrong rala a bunda no chão para pendurar-se embaixo de um caminhão em movimento; n'outro, bate propositalmente com um sidecar contra outro veículo para livrar-se de um caroneiro indesejado!
E, claro, tudo termina num daqueles massacres hiper-exagerados típicos do cinema de ação da década de 1980, quando Armstrong (finalmente vestido de ninja, o que não acontece durante o resto do filme) e Jackson (vestido de Rambo) invadem a fortaleza dos vilões distribuindo shurikens, espadadas e tiros de metralhadora.
Até me impressionou a quantidade de mortes ao longo do filme. Segundo o IMDB, a contagem de cadáveres chega a 114. Porém é um tanto frustrante a ausência de sangue e violência: a não ser alguns buraquinhos de bala e dois pescoços cortados, as espadadas dos ninjas não fazem nenhum estrago, nem vemos os característicos jorros de sangue que estes golpes costumam proporcionar nas aventuras orientais.
Logo, apesar da matança superior a 100 figurantes, AMERICAN NINJA é de uma violência quase inofensiva e poderia muito bem passar na Sessão da Tarde – e provavelmente passou!
Outro fato curioso é que Dudikoff não tinha nenhum treinamento em artes marciais quando fez o filme, mas o finado Steve James, que interpreta seu parceiro, sim - ele praticava kung-fu desde a juventude. Talvez por isso, e para não minimizar a pouca experiência do verdadeiro protagonista da aventura, James quase não luta durante o filme inteiro, preferindo usar armas de fogo e até um míssil (!!!) para despachar os vilões.
Além de funcionar bem como filme de ação, AMERICAN NINJA também diverte bastante pela idiotice geral da coisa.
Afinal, os ninjas caíram praticamente de pára-quedas na trama, tanto o herói (um ocidental treinado na infância por um veterano da Segunda Guerra Mundial) quanto os vilões, que convenientemente trabalham como capangas para o contrabandista de armas, embora ele já tenha um exército de mercenários fortemente armados à disposição.
O problema é que, tirando as roupinhas pretas e as armas brancas, são uns ninjas tão fracotes e fáceis de matar (com exceção do interpretado por Tadashi Yamashita, claro) que o roteirista poderia muito bem colocar qualquer outra coisa no lugar de assassinos ninja, de mulheres de topless a piratas. Só que aí o filme não se chamaria "American Ninja"...
A situação dos roubos de armas do quartel, encobertados pelos figurões do lugar, também é tão absurda que chega a dar dó. Quer dizer, os caras perderam diversos carregamentos e continuam mandando mais e mais caminhões carregados de armas e munições para serem roubados pelos ninjas inimigos, ao invés de pensar num plano alternativo - ou pelo menos investigar o paradeiro dos outros armamentos roubados?
E como não citar o irritante interesse romântico do herói, a mocinha interpretada por Judie Aronson? Ela não foge daquele clichê "garota em perigo" que primeiro odeia o protagonista e depois se apaixona por ele, mas é tão chata que você torce para o "american ninja" também ficar estressado e dar uma voadora nela.
Infelizmente, a bela Judie não mostra seus atributos físicos, que já tinham sido largamente explorados em seu trabalho anterior, "Sexta-feira 13 Parte 4 - O Capítulo Final".
Não que isso tenha importado para o resultado final: AMERICAN NINJA custou um milhão de doletas e lucrou, dependendo da fonte, entre US$ 10 e 30 milhões - ou seja, dez ou trinta vezes o que custou.
Feliz da vida com o sucesso muito maior que o do anterior "Ninja III", a Cannon deu sinal verde para a produção de várias sequências, das quais apenas a segunda foi assinada por Firstenberg; as outras têm diretores diferentes e até protagonistas diferentes, pois Dudikoff não aparece nas partes 3 e 5.
No fim, quem mais lucrou com o sucesso de AMERICAN NINJA foi o próprio Michael Dudikoff, já que o loirinho com cara de surfista foi esculpido na marra para virar herói de ação do segundo escalão.
E, quem diria, ele até conseguiu enganar muita gente, estrelando uma série de filmes de baixo orçamento para a Cannon nos anos seguintes, e inclusive roubando um outro papel de Chuck Norris ao estrelar "A Vingança de 1 Predador" (1986), originalmente concebido como continuação de "Invasão USA" (que tinha Norris como astro).
PS: No Brasil, AMERICAN NINJA foi originalmente distribuído nas locadoras e exibido na TV com o título "Guerreiro Americano". Vai ver os dubladores tinham medo de que os brasileiros não soubessem o que era um ninja