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WILLIAM SALGADO - RESPONDE ÀS 7 PERGUNTAS CAPITAIS

William Salgado é colecionador de filmes, fundador do Núcleo de Cinema “Juiz de Fora, Cidade Aberta”, tendo auxiliado no final dos anos 90 e início dos anos 2000, o projeto social da prefeitura, “Cinema para todos” com mostras de diversos cineastas (em torno de 30) e temáticas (musical, screwball comedy, western, horror, cinema iraniano, cinema marginal ou de invenção, nouvelle vague, cinema novo, expressionismo alemão, cubismo e dadaísmo, neorrealismo), escrevendo textos em folders de divulgação, empréstimos de filmes e condução de debates, por quase 03 anos.

No início dos anos 2000, foi um dos fundadores da revista eletrônica “Duas ou Três Coisas que eu sei Dela”, extinta precocemente. Por alguns anos, participou dos ciclos de cinema da UFJF, apresentando e debatendo obras de cineastas como Robert Bresson, Jean-Luc Godard, Luis Buñuel, Glauber Rocha e David Lynch.

Vamos às 7 perguntas capitais:


1) É comum lembrarmos com carinho do início da nossa relação com o cinema. Os filmes ruins que nos marcaram, os cinemas frequentados (que hoje, provavelmente, estão fechados), as extintas locadoras de VHS e DVD que faziam parte do nosso cotidiano. Conte-nos um pouco de como é sua relação com a 7ª arte. Quando nasceu sua paixão pelo cinema? 

W.S.: Acho que por volta dos 06 anos de idade, quando a TV Globo exibia nos domingos à tarde, filmes do Chaplin e, durante a semana, nas sessões da tarde, Jerry Lewis. O mágico de Oz, Rocky e Superman II me marcaram profundamente naquela época. Já a primeira vez que me lembro de estar numa sala de cinema foi com meu pai, assistindo ao filme Os Saltimbancos Trapalhões. Até então, era só um deleite prazeroso, mas sem envolvimento intelectual.

Em 1996, morando em Juiz de Fora, comecei, por influência de dois amigos, Alessandro Coimbra e Sandro Carvalho, a assistir ao cinema clássico americano e depois ao europeu. Hitchcock, Welles, Wilder, Wenders, Fassbinder, Rossellini, Buñuel, Fellini, os musicais americanos, Capra e Godard. Daí a coisa meio que mudou de figura, fiquei transtornado, com febre terçã por esse universo.

Comecei a ler tudo que chegava às minhas mãos: livros, revistas especializadas e artigos. Estudava cinema, umas 6 horas por dia. Percebi que estava diante da mais potente e popular expressão artística, capaz de mostrar a alma no corpo e nos colocar diante do mundo. Como disse certa vez Michel Mourlet, “O cinema substitui o nosso olhar por um mundo que corresponde aos nossos desejos”.

No entanto, não me considero um típico cinéfilo, por vezes sou o oposto, visto que não tenho tempo e menos vontade e paciência em assistir a tudo que é produzido, fico selecionando os filmes pelos cineastas de que gosto, que estão cada vez mais raros.


2) Tyler Durden disse em Clube da Luta: "As coisas que você possui acabam possuindo você". Ser colecionador é algo que se encaixa neste conceito, já que você se torna escravo do colecionismo. Coleciona filmes, CDs ou algo relacionado à 7ª arte? 

W.S.: Comecei colecionando VHS, ia às locadoras e negociava a compra de filmes de arte, que têm baixa procura, no final dos anos 90 e início dos anos 2000. Gravava também o Corujão (Globo), a Sessão Comédia, que era exibida nas madrugadas de segunda, o Carlton Cine e o Cineclub Band e os filmes de arte que a TVE exibia nos sábados à noite. 

Depois vieram os DVDs e os Blu-rays, mas atualmente mantenho a maioria em HDs externos, que já chegam perto dos 10 TB! A internet facilitou demais a vida, por um lado. Antes, não era assim. Para conseguir acesso ao Desprezo, do Godard, por exemplo, que havia sido lançado pela Globo Vídeo, tive de ir a Três Pontas e comprar, por um preço alto! Mas isso dava mais valor a essas aventuras de bandeirante... 

Coleciono livros e ensaios de cinema. Até coleciono CDs, mas não de trilhas sonoras. Também tenho alguns cartazes originais de filmes e outros materiais iconográficos, que consegui graças à generosidade de um amigo, o João, que tinha milhares de memorabilia e que, por ter trabalhado no cinema, ficou com muita coisa quando do fechamento.


3) A criação do cineclube "Luzes da cidade" veio de uma necessidade de suprir a lacuna dos movimentos cineclubistas de sua cidade? E em que momento essa ideia tomou forma?

W.S.: Sim, criei o grupo para estudos de cinema, em 09 de outubro de 2002, quando o acesso aos filmes ainda não era tão fácil. O grupo se manteve até o início de 2009, mesmo com a facilidade de acesso, que já havia na época. Depois, tive de mudar de cidade, assim como outros amigos, e o grupo se desfez. 

Mas cumprimos bem nosso papel: demos curso de introdução à História do Cinema, começamos a filmar um média-metragem, “Folhas Soltas”, que continua inacabado, organizamos mostras e debates, abertas ao público, sem qualquer recurso externo, tudo pela vontade de fazer com que a história do cinema fosse contada, ou seja, que os filmes fossem exibidos ao maior número de pessoas possível.

Antes disso, no início de 2000, eu e 4 amigos criamos a revista eletrônica “Duas ou Três Coisas que eu sei Dela”, que acabou precocemente, por problemas internos. Em ambos os casos, e acredito que seja o mesmo sentimento de hoje em dia, havia uma vontade de reunir náufragos, ávidos por partilhar experiências e opiniões. A vontade, acho que ainda existe. Talvez hoje falte um pouco mais de atitude da nova geração, que vem se banalizando pela facilidade de acesso a tudo e pela intolerância às divergências de opinião.

M.V.: Com o decorrer dos anos, a internet e os grupos de cinema online substituíram o contato presencial, reunindo os interessados em cinema. É uma pena que, com o crescente isolamento social proporcionado, justamente pela rede social, os movimentos cineclubistas ficaram de lado, não é? O que pensa desta mudança?

W.S.: Costumo provocar e dizer que minha geração era carente de acesso e a geração de hoje é carente pelo acesso; com o excesso, tudo fica muito dissipado, diluído. Com o isolamento social, a onda virtual tem nos tornado mais cínicos. Um texto do Louis Skorecki, que indico como resposta à pergunta 7, pode ajudar-nos a compreender um pouco melhor as coisas.

4) "A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos". Considerando a reflexão, há alguma experiência vivida no meio artístico que foi especialmente marcante?

W.S.: Não acredito que tenha tido grandes experiências, mas experiências ordinárias, que me deixaram numa alegria contagiante ou o olho marejado. Bem, vou compartilhar alguns desses momentos: as lições técnicas, aprendidas com o amigo, José Sette; os dias de filmagem do roteiro, “Folhas Soltas”; o interesse do público pelas minhas palestras na UFJF para as turmas de Humanas e Jornalismo, sendo eu, acadêmico da saúde, vestido todo de branco, por obrigações curriculares; a visita à Cinemateca Francesa e à Cinecittà; conversas por telefone com o Julio Bressane, com lições valiosas; estar citado carinhosamente pela amiga Daniela Santos, em sua defesa de tese, na Sorbonne (França), sobre a obra do Bressane.

5) Com relação às suas preferências cinematográficas, há uma lista dos filmes de sua vida? Um Top 10 ou mesmo o filme mais importante? 

W.S.: Hoje, com validade até depois de amanhã, seriam esses meus filmes de cabeceira: Um corpo que cai, Batedor de carteiras, À beira do abismo, A rua da vergonha, A roda da fortuna, O demônio das 11 horas, Berlin Alexanderplatz, Uma mulher sob influência, Quando duas mulheres pecam, Portal do paraíso, Viagem à Itália, Regra do Jogo.

6) Imagine o cenário: você é um diretor (de qualquer país) no set de filmagem de um filme memorável. Quem seria, em qual filme, e por que essa experiência seria tão marcante para você?

W.S.: Infelizmente, não somos influenciados pelo que queremos, mas sim pelo que podemos ser influenciados. Dito isto, se pudesse (e estou certo de estar muito longe de poder), gostaria de ser influenciado por 3 cineastas: Jean-Luc Godard, Julio Bressane e John Cassavetes. E não vou citar um filme específico, apenas os criadores e motivos:

Godard, que é para mim o maior artista do século XX, eu admiro a visão de cinema e mundo, sua filmagem de ideias, os tecidos citacionais que cria e sua peculiar montagem dos últimos 40 anos.

Bressane, pelo tesão explícito na fase dos anos 60 e 70, filmando da maneira que podia, sem recursos.

E Cassavetes pela maneira como acredita nos corpos. Um cinema que professa uma fé inabalável nas relações corporais. E um total respeito pelos atores.

7) Ao olhar para sua trajetória, qual aprendizado considera mais valioso e gostaria de compartilhar?

W.S.: Como amador convicto, não posso deixar lições, os filmes estão aí, precisam ser vistos. O que posso fazer é indicar alguns caminhos que me ajudaram a compreender melhor a arte cinematográfica.

Primeiro, quando se é um iniciante, é preciso destacar a lição do escritor e sociólogo francês, Roland Barthes, sobre o prazer de um texto: “nenhum poder, um pouco de saber, um pouco de sabedoria, e o máximo de sabor possível". Ou seja, tentar se aproximar das obras pelo sabor que elas oferecem.

Na busca por um aprofundamento maior na sétima arte, destaco minimamente a leitura de alguns livros, como “O cinema”, de André Bazin, “A Mise en Scene no Cinema: do Clássico ao Cinema de Fluxo”, do Luiz Carlos Oliveira Jr., e, se conseguirem acesso, em sebos, os livros “Os Grandes Cineastas”, do Henri Agel, e “Os Filmes da Minha Vida”, de François Truffaut, para se compreender o que é a paixão pelo cinema.

M.V.: Obrigado amigo. A gente se vê por aí. 


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