MARCO ANTONIO SANTOS FREITAS - RESPONDE ÀS 7 PERGUNTAS CAPITAIS
Marco Antônio Freitas nasceu em Teresina, no Piauí, filho de um militar nordestino e de uma pedagoga gaúcha. Viveu a maior parte da vida em Porto Alegre, onde cursou Publicidade na Universidade Federal, antes de se transferir para o curso de Cinema na Columbia College-Hollywood, nos Estados Unidos. Posteriormente, especializou-se em Roteiro na UCLA e participou de workshops na Escuela de Cine y Televisión de San Antonio de los Baños, em Cuba, onde teve contato com nomes como Nelson Xavier, George Lucas e Francis Ford Coppola. Atuou em diversas funções na produção de comerciais e projetos audiovisuais para empresas.
Cinéfilo e pesquisador dedicado, entrevistou diversos nomes ligados ao cinema para veículos do Brasil e do exterior, como Brian Trenchard-Smith, Albert Pyun, Dedé Santana, Leopoldo Serran, entre outros. Também colaborou com livros voltados à história e à cultura cinematográfica, incluindo o prefácio de Casablanca – A Criação de uma Obra-prima Involuntária do Cinema (de Renzo Mora) e participações em obras como Cemitério Perdido dos Filmes B, Perdidos no Espaço, Homem Não Entende Nada! – Arquivos Secretos do Planeta dos Macacos, e Vanessa Alves – Coletânea de Imagens & Palavras.
Vamos às 7 perguntas capitais:
1) "É curioso como as cores do mundo real parecem muito mais reais quando vistas no cinema." Pensando nesta bela frase do filme “Asas do Desejo” (Der Himmel über Berlin), de Wim Wenders, o que o cinema representa para você?
M.F.: Representa tudo, amigo. TUDO! Cinema é meu parente, meu amigo e, dependendo do filme, minha amante... não tenho como começar a contar o número de vezes que um bom filme revisitado me deu alento... eu temia que um grande filme visto com uma namorada tivesse a experiência PRESA àquele relacionamento, Marcus, e com o final da relação, o filme, de certa forma, 'perdesse' o seu valor (ou até, não 'pudesse ser revisto' por estar intimamente linkado com a ex-namorada). Descobri que, sendo o filme bom, ele transcende isso tudo.
M.V.: Verdade. Faz todo sentido.
M.F.: Olha, sem acesso a filmes, eu provavelmente estaria com as mãos atadas para trás, pensando em algum filme sobre fuga de detentos para bolar um jeito de como escapar do manicômio...(risos). Ah, tem filme por aí que, muitas vezes, substituiu remedinhos para a minha ansiedade.
2) É comum lembrarmos com carinho do início da nossa relação com o cinema. Os filmes ruins que nos marcaram, os cinemas frequentados (que hoje, provavelmente, estão fechados), as extintas locadoras de VHS e DVD que faziam parte do nosso cotidiano. Conte-nos um pouco de como é sua relação com a 7ª arte. Quando nasceu sua paixão pelo cinema?
M.F.: Eu, quando tinha uns quatro anos, já lia e amava desenhar. Hoje em dia, não tenho mais paciência para isso. Refiro-me a tentar criar histórias em quadrinhos, e lembro que dei muito trabalho aos adultos, principalmente ao meu redor: parentes e professores (o primeiro time aplaudia os meus esforços; o segundo grupo me expulsava da sala de aula e chamava o primeiro grupo para reclamar... ambos acabavam servindo de mais inspiração ainda para as minhas caricaturas (quando se está de castigo por desenhar o professor e ressaltar o enorme nariz e as orelhas de abano dele, nada melhor, enquanto a mãe enfurecida não chega para buscá-lo na sala da diretoria, é passar o tempo desenhando mais gente)!
Tudo isso era influenciado por desenhos animados (adorava os de Tom&Jerry feitos nos anos 40 e começo dos anos 50 exibidos com frequência nas TVs dos anos 70 e parte dos 80... aqueles com um Tom gorducho e descabelado, um Jerry gordinho e afeminado, as pernas da empregada da casa aparecendo, e o trio lidando tudo com muita violência e sadismo surreal). Era viciado também no melhor seriado de TV que eu já vi, o icônico Batman, estrelado por Adam West e Burt Ward.
A Sessão da Tarde com seus longas de Elvis, Terence Hill & Bud Spencer, as reprises de Ardida Como Pimenta com Doris Day e Os Marujos do Amor, com Gene Kelly dançando com... o rato Jerry (sim, houve uma época em que a criançada tinha acesso a clássicos feitos trinta anos antes na TV aberta!!)... lembro também de, tarde da noite, ver o futuro Darth Vader, o fisiculturista britânico Dave Prowse, no assustador O horror de Frankenstein e isso ter tirado o meu sono.
Recordo-me de ficar grudado na telona, impressionado com o King Kong de Dino de Laurentis, o Búfalo branco que atacava Bronson, Travolta matando a pau tanto nas pistas (e mais tarde na brilhantina); eu tendo que sentar na escada interna do Cinema devido à superlotação do local para ver o melhor Superman de todos (Christopher Reeve) voar com Lois Lane enquanto a bela 'Can You Read My Mind?' Era cantada por Maureen McGovern, foi demais.
Peter Sellers interpretando o Inspetor Clouseau em A nova transa da Pantera cor de Rosa (minha introdução à saga cinematográfica dirigida por Blake Edwards) me marcou muito. E as fotos (!!!) de Udo Kier com os olhos esbugalhados vomitando sangue no hall do finado Cinema Ritz, divulgando Drácula de Andy Warhol, fizeram eu pedir para dormir com a minha irmã com medo de ataques de vampiros.
3) Tyler Durden disse em Clube da Luta: "As coisas que você possui acabam possuindo você". Ser colecionador é algo que se encaixa neste conceito, já que você se torna escravo do colecionismo. Coleciona filmes, CDs ou algo relacionado à 7ª arte?
M.F.: Francamente? Não. Guardo a maioria na cabeça e tenho muita coisa anotada em alfarrábios (gostou da expressão antiquada? Pesquisei no dicionário para parecer chique.
M.V.: Tive que procurar no dicionário para saber o significado (risos).
4) Com relação às suas preferências cinematográficas, há uma lista dos filmes de sua vida? Um Top 10 ou mesmo o filme mais importante?
M.F.: Vou tentar facilitar a tua vida e a minha! Meu primo no Piauí, há uns cinco anos, pediu 'umas indicações', e como eu estava insone, acabei passando uns 130 títulos.
M.V.: 130??!! Manda ver...
M.F.: Ok, sem ordem de preferência alguma, please:
007 O Espião Que Me Amava (minha intro ao universo Bond... vi num Drive-in no litoral gaúcho!!) ;
Bye Bye Brasil (provavelmente o meu filme nacional favorito... e notem as semelhanças com o filme do Eastwood, Bronco Billy, feito pelo americano depois do nosso);
Police e Aos Nossos Amores (os dois de Maurice Pialat e com Sandrine Bonnaire);
Os Embalos de Sábado à Noite (obra-prima);
Par ou Ímpar (a dupla italiana no mundo dos jogos de azar);
Dias de Ira (Giuliano Gemma e Lee Van Cleef);
Menino do Rio (de Antonio Calmon);
Bete Balanço (um dos melhores finais que eu já vi em filme);
Três Homens em Conflito (Leone);
Popeye (não sou fã do diretor Bob Altman, mas essa transposição – provavelmente o filme menos pessoal dele e provavelmente o meu favorito da filmografia dele);
Ben-Hur (Charlton Heston matando a pau);
Os Pássaros (meu predileto do Hitch);
Diabolik (Mario Bava fez um filme ambicioso e cheio de gadgets e efeitos com o orçamento de fixador de cabelo nos 007);
Les Diaboliques (apesar da semelhança no título, nada tem a ver um com o outro... o primeiro é a adaptação dos quadrinhos adultos com o anti-herói mais amoral e priápico da Europa; o segundo é um aterrorizante suspense francês estrelado pela carioca Vera Amado);
Caçada Implacável (Peter Fonda e o astro de Diabolik, John Phillip Law, junto do argentino Alberto de Mendoza – que fez o pai de Antonio Fagundes no adorável Bossa Nova – numa aventura cheia de tensão);
Zapped! – Uma Mistura Muito Especial (comédia juvenil sobre nerd que adquire superpoderes obtidos com experimento com maconha);
O Último Americano Virgem (comédia dramática sobre adolescentes virginais cujos últimos dois minutos deixaram a gurizada na plateia traumatizada);
O Bagunceiro Arrumadinho (Jerry Lewis no seu melhor momento);
O Dólar Furado (Gemma de novo);
Breathless – A Força de um Amor (com Valérie Kaprisky e Richard Gere num dos filmes americanos não-pornôs com teor sexual mais franco dos anos 80);
Conrack (Voight dando aulas);
Tootsie (Dustin, que ajudou e muito no roteiro, deveria ter sido creditado nessa área);
A Morte Comanda o Cangaço (intenso, viril e assustadoramente violento). Estrelado por um astro que nos últimos tempos antes da morte eu tive a honra de conhecer, Alberto Ruschel.
E muito, MUITO mais filmes...
5) "A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos". Considerando a reflexão, há alguma experiência vivida no meio artístico que foi especialmente marcante?
M.F.: Uma interessante de citar foi a de três dias estagiando em O Demolidor, vendo Stallone, com instruções claras de não encarar o astro antes de entrar no set e o mega produtor Joel Silver (Máquina Mortífera, Matrix) decidindo quais takes com o Sylvester no monitor deveriam repetir sem consultar o novato diretor (meu xará Marco Brambilla)...
6) Fale um pouco sobre os seus próximos projetos.
M.F.: Estou pesquisando incessantemente material para livros (ambos sobre a sétima arte... um, eu adianto, tem algo a ver com o humor judaico-americano).
Ah! Como quero ficar milionário, estou pensando também em começar a jogar na loteria...
M.V.: Jogar é um começo... 😄
7) Ao olhar para sua trajetória, qual aprendizado considera mais valioso e gostaria de compartilhar?
M.F.: Bah, não tenho pretensão de dar lição de vida a ninguém, mas asseguro uma coisa a você que me dá a honra de ler o que escrevo neste momento: bons filmes podem ser os seus melhores amigos.
M.V.: E como amigo. Grande abraço.
M.F.: Abraço e valeu pela oportunidade!