JOGA A MAMÃE DO TREM (1987) - FILM REVIEW
Jogue a Mamãe do Trem é mais um clássico oitentista revistado por mim, quase 30 anos depois. É hora de analisar o filme sob uma ótica que eu era incapaz quando tinha meus 15 anos, quando o assisti em uma sessão da tarde na época.
Na trama, Owen Lift (Danny DeVito) e Larry Donner (Billy Crystal) são dois homens que têm pelo menos uma coisa em comum: querem ser escritores, mas não conseguem. O primeiro por absoluta falta de talento e o segundo por sofrer uma espécie de bloqueio. Mas eles têm outra coisa em comum: ambos adorariam ver uma mulher morta. No caso de Owen, ele gostaria que sua mãe morresse, pois passou grande parte do seu tempo cuidando da mãe, que o atormentava o tempo todo. Já Larry sonha em ver morta sua ex-mulher, Beth (Kate Mulgrew), que o abandonou levando seus textos e publicou tudo sobre seu nome. Os dois cada vez mais alimentam o desejo de eliminar estas mulheres de suas vidas e a melhor maneira de saírem impunes é trocando os assassinatos entre si.
O título original do filme é uma referência à canção de Patsy Cline que diz "Throw Momma from the Train, a kiss, a kiss, Wave Momma from the train a goodbye...". Não há como deixar de associar o filme com Pacto Sinistro, obra-prima de Hitchcock. O filme, que é uma refilmagem disfarçada, usa o próprio filme como inspiração, literalmente (o personagem de Danny vai ao cinema assisti-lo). Na produção, de 1951, dois completos desconhecidos concordam em matar alguém de quem o outro quer se livrar. O aristocrata Bruno Anthony encomenda a morte do seu odioso pai, e o jogador de tênis Guy Haines quer se divorciar da mulher para se casar com a filha do senador.
Como podem ver, alguns elementos mudam, mas a história é basicamente a mesma. DeVito faz um personagem atormentado, estressado e no limite de sua relação com uma mãe completamente abusiva. As próprias características físicas do ator realçam a ideia de dominação da mãe com um filho que ela vê como criança. Mas não é só a dominação que deixava o personagem louco. A atriz (que também tinha uma expressão facial forte, inconfundível) sabia fazer como ninguém uma pessoa rabugenta e que pratica bullying com quem estiver por perto. E seu filho era o que mais sofria. Não que isto justificasse ser morta.
O grande problema de tornar a referência ao filme de Hitch explícita foi que a Warner detinha os direitos e não estava disposta a colaborar com a Orion. Porém, a Warner percebeu que a Orion ainda detinha os direitos de Arthur, o Milionário Sedutor (1981), que eles queriam trabalhar numa continuação. Sendo assim, o jogo de interesses os fez trocarem serviços. Curiosamente, Arthur, o Milionário Arruinado (1988) acabou sendo um desastre de bilheteria, enquanto "Jogue a Mamãe do Trem" foi o 13º filme de maior sucesso de 1987.
No filme há uma sequência de cenas que valem a pena serem comentadas. Primeiro, a do famoso túnel no Griffith Park em Los Angeles. Este é o mesmo túnel que foi visto em De Volta para o Futuro (1985) e Uma Cilada para Roger Rabbit (1988), todos lançados próximos. Ele também foi visto em muitos outros filmes nos anos a seguir. Na sequência do filme, quando a dupla está na casa de Danny, ocorre a antológica cena em que o ator bate com a frigideira na cara de Billy.
Como poderíamos imaginar, ela foi feita de borracha, mas a cena é tão bem feita que parece que ele se machuca de verdade. E por fim, a cena em que Owen mostra sua coleção de moedas para Larry, foi inspirada por seu hábito de infância de compartilhar coisas com amigos que envolviam tudo o que ele fazia na época. Como diretor, ele insistiu em incluir essa sequência no filme. O escritor Stu Silver escreveu a cena.
O grande episódio triste do filme é sobre a atriz Anne Ramsey. A aparência da atriz durante o filme denunciava seu estado de saúde frágil. Ela sofria de um câncer no esófago há poucos anos (a cirurgia afetou sua fala). Ela tinha apenas 59 anos, mas aparentava bem mais. A doença deu uma "folga" com os tratamentos, mas a metástase cresce em silêncio. Já na produção de "Jogue a Mamãe do trem" ela teve que fazer cirurgias (o espectador atendo verá que ela some parte do filme). Em algumas cenas, um curativo no pescoço pode ser visto.
Sua voz é nitidamente alterada. Durante a produção, a atriz sofreu com dores intensas. Danny DeVito , que também dirigiu, disse numa entrevista que ela nunca pediu para ser dispensada do trabalho. "Mamãe" acabou se tornando a atuação mais elogiada pela crítica de Ramsey, culminando com a indicação ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante em 1988 (perdeu para Olympia Dukakis em 'Feitiço da Lua").
O final do filme foi ambientado 1 ano depois (ou seja, 1988). Larry e Owen se encontram novamente e Larry pergunta "Como está a mamãe?" Owen responde "Morta". De fato, isto aconteceu na vida real. O filme foi lançado em dezembro de 1987 nos EUA, mas em muitos países só foi lançado no segundo semestre de 1988, quando a atriz já havia falecido. Ele morreu no dia 11 de agosto. Originalmente, o filme terminaria com Owen revelando a Larry que "Mamãe" morreu engasgando com uma noz salgada (e curiosamente, ela faleceu de um câncer na garganta).
Há também uma curiosidade bem interessante envolvendo a dupla central. Ambos trabalharam com Woody Allen: Billy Crystal em Desconstruindo Harry (1997) e Danny DeVito em Igual a Tudo na Vida (2003). Em Desconstruindo Harry, coincidentemente, Cristal interpreta outro personagem chamado Larry. E, além disto, um dos grandes sucessos da carreira de Billy se chama Harry e Sally - Feitos Um para o Outro (1989). Note que, Harry é o nome do filme de Allen. E por fim, os nomes são parecidos (Larry, Harry, Sally).
Por outro lado, DeVito fez Júnior em 1994 (aquele que Arnold Schwarzenegger engravida) e seu personagem se chamava... Dr. Larry!!! Um ano antes da produção em questão, ou seja, 1986, Danny fez um filme chamado "Quem Tudo Quer, Tudo Perde" e seu personagem se chamou "Harry".
Coincidência? Destino? Ou eram filmes de Tarantino? Nunca saberemos.