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BLADE RUNNER (1982) - FILM REVIEW

Blade Runner.

Texto: M.V.Pacheco

Revisão: Thais A.F. Melo



A jornada de Roy buscando seu criador em busca de saber quanto tempo tem de vida coincide com a nossa própria.

Por ordem natural ou não, muitas vidas cessam sua estada neste mundo neste exato momento. Parecemos insignificantes vistos de um todo, mas cada caso particular, geralmente tem sua importância. Mas e se, de alguma forma, soubéssemos quanto tempo nos resta neste mundo? Viveríamos  mais intensamente? Nos prepararíamos mais para o dia da partida? Perguntas, obviamente sem respostas...

Blade Runner - O Caçador de Andróides é sim, um filme filosófico. Baseado no  romance Do "Androids Dream of Electric Sheep?" de Philip K. Dick, a história se passa em 2019, numa Los Angeles tomada por sujeira, poluição, chuva e cultura oriental (induzindo, claro, a ideia de que ela faz parte do cenário de forma determinante, e porque não, causadora). Este cenário opressivo explica a migração frequentemente referenciada de seres humanos para colônias extraterrestres. Deckard é chamado para "aposentar" andróides de uma geração mais desenvolvida. Ele é um tipo de detetive com autorização de matar. Mas no caminho, Deckard se depara com questões morais e existenciais, que vão mudar sua visão (e atitude) diante do mundo.


O filme propõe o paralelo entre criações. Deus "criou" o homem, perfeito, mas com tempo determinado e livre arbítrio para ter atitudes questionáveis.  Da mesma forma, o homem criou o androide perfeito, mas com tempo determinado e também livre arbítrio para ter atitudes questionáveis. O que , a principio, poderia sugerir atitudes vilanescas, nada mais é que o reflexo da natureza humana.

A jornada dos Replicantes (principalmente Roy) de certa forma acusa uma utopia: e se conseguíssemos chegar ao nosso "Deus"? Ele teria o mesmo destino de Tyrell caso a resposta fosse a mesma dada no filme?

Roy, ao final, como nós, é obrigado a aceitar o destino cruel, num dos pontos altos do cinema mundial. Seu monólogo, é aceito e entendido por Deckard, e por nós, como uma das maiores e melhores despedidas de um personagem das telas (e da vida).  Somos obrigados a imaginar lugares que Roy visitou, sem nunca podermos compartilhar daquela experiência. E sua lágrima final, que nunca é vista, mas é sentida pelo mesmo, que lamenta que ela , e todos aqueles momentos, se perderão.

"Eu faço amigos. Eles são brinquedos. Meus amigos são brinquedos, eu os fiz. É um hobby. Eu sou um designer genético. Porque, você é tão diferente.... Você é tão perfeita! Há algo de mim em você... Mostre-me alguma coisa."

Cortes...

1) Final cut

O final cut, tem um elemento pontual e determinante: O unicórnio. Ele é o causador da maior ruptura do personagem vivido por Harrison Ford e da aproximação total do paralelo citado acima. Deckard, e de certa forma, todos nós, somos replicantes. Seus constantes sonhos  somados ao final em que o policial Gaff deixa um unicórnio de origami para Deckard, estampa em película a mais aterradora realidade: Deckard é um replicante. Poderia ser um final ambíguo, já que Gaff tem o hábito de fazer origamis e pontuá-los pelo filme.  As imagens de unicórnios mostram que os personagens, humanos ou replicantes, compartilham os mesmos sonhos e reconhecem sua afinidade. Mas o que poderia sugerir apenas uma coincidência, foi confirmado  em julho de 2000, quando o diretor Ridley Scott declarou, em entrevista à tv britânica, que o personagem Deckard também era mesmo um replicante. #treta Harrison não queria isto.


2) Versão de cinema

Para começo de conversa, esta é a versão com final otimista, além de não ser o corte preferido do diretor. E a narração em off está presente, pontuando o filme com explicações pertinentes. Nesta versão, qualquer traço de Deckard ser um replicante é eliminado. Revendo o filme, depois de assistir Blade Runner 2049, também sugere que este filme tem uma melhor conexão com a versão de cinema do filme de Scott.

3) Versão Workprint

O filme começa bruscamente, com o nome de Ford e o título bem diferente do que vimos no cinema, em letras garrafais vermelhas, seguida de um verbete de dicionário que define o que é “replicante”. Não há os intertítulos explicando sobre o status quo dos androides como no original ou versões posteriores. Isso e a ausência de narração em off arremessa o espectador diretamente na história, mas sem que ela seja mastigada, com a função de Rick Deckard sendo apenas aos poucos revelada.


Algumas tomadas clássicas inexistem aqui. Duas delas, a do close-up extremo em um olho vendo a cidade à noite e o plano geral clássico do edifício piramidal da Tyrell Corporation, fazem falta aos que se acostumaram com as demais versões do filme. Mas há um sobrevoo na cidade em que ouvimos a frequência do rádio da polícia “cantando” a chegada de Holden para fazer o teste Voight-Kampff em Leon, sequência que vemos imediatamente depois, mas com takes diferentes.

Essa audição da frequência do rádio da polícia, aliás, é uma constante no Workprint, mas de forma alguma com a função de substituir a narração em off. Basicamente, toda vez que vemos o interior de um spinner (o nome dos carros voadores) ouvimos um pouco do rádio.

Ao longo de toda a projeção, são os takes diferentes das mesmas sequências que dão volume às “diferenças” entre o Workprint e as demais versões de Blade Runner. Alguns momentos mais longos, outros mais curtos, mas, no geral, o que vemos é quase que integralmente a mesma coisa.

De resto, há que se destacar que a mixagem sonora do Workprint é ruim, pois abafa a voz em diversos momentos com o som ambiente, efetivamente tornando necessário aumentar o volume para ouvirmos alguns diálogos. A imagem também é menos do que perfeita, já que, como disse, o original degradou-se com o tempo, já que não é comum guardar com cuidado versões de teste de filmes.


Mas, em meio a esses problemas, alguns takes diferentes – além das alterações maiores que mencionei acima – se destacam:

A conversa de Deckard com o egípcio fabricante de cobras artificiais é mais longa e mais interessante;
Essa sequência é seguida por um momento em que Deckard pergunta a um policial onde fica a boate de Tuffy;
A luta com Zhora é razoavelmente diferente e mais brutal;
Quando Leon morre, nós vemos sua cabeça estourada, mas não o vemos cair junto com Deckard no chão. Ao contrário, há um corte para Rachael e a sequência continua nela;
O assassinato de Elden Tyrell é muito mais brutal, violento e gráfico;
A luta entre Pris e Deckard é também muito mais brutal, com uma Pris cada vez mais ensandecida toda vez que a câmera volta para ela;
A sequência em que Batty, pela parede, puxa o braço de Deckard para quebrar seus dedos, é bem diferente, com takes mais longos e explícitos;
A sequência em que vemos Deckard voltando para casa atrás de Rachael é bem mais curta;
O final – com os dois indo em direção ao elevador – é mais curto também e mantém o viés incerto e razoavelmente pessimista das versões anteriores, sem o discrepante epílogo “verde” da versão do cinema;
Não há créditos, apenas um abrupto “The End”.


4) Versão de cinema internacional

O corte internacional conta com um minuto a mais, totalizando 117, e é praticamente a mesma versão do lançamento nos cinemas estadunidenses, com a inserção de detalhes mais violentos em três cenas que foram cortados da versão estadunidense pela censura.

Esta versão também é conhecida como Criterion Edition, ou “versão sem cortes”. A Warner a lançou na Europa, Austrália e Ásia em laserdisc (quem aí lembra desse formato?). Posteriormente, ela também foi lançada na América do Norte em VHS e laserdisc e relançada em 1992, rebatizada como “Edição de 10º Aniversário”.

5) Versão do diretor

Ridley Scott foi envolvido no projeto, ainda que mais uma vez ele não tivesse controle total da coisa, mas ele aproveitou a chance. Com 116 minutos de duração, Scott fez três grandes mudanças em relação à versão de cinema.

A primeira: retirou todas as narrações. A segunda e uma das mais importantes: incluiu a famigerada cena do sonho com o unicórnio, uma cena chave para a interpretação de que o próprio Deckard seria um replicante. E, por fim, removeu o final feliz.

Essa versão do diretor foi lançada em VHS e laserdisc em 1993 e em DVD em 1997. Por conta disso, quem assistiu ao filme no Brasil em disco digital, provavelmente assistiu a esta montagem. Ela também fez parte da Ultimate Edition com cinco discos.


Harrison, o abençoado.

Os três maiores papeis do ator caíram no seu colo: Indiana Jones, Han Solo e Deckard. No caso específico do Blade Runner, o roteirista Hampton Fancher queria Robert Mitchum como Deckard tendo escrito o filme pensando nele. Nomes como Gene Hackman, Sean Connery, Jack Nicholson, Paul Newman, Clint Eastwood, Tommy Lee Jones, Arnold Schwarzenegger, Al Pacino e Burt Reynolds foram considerados. Mas foi com um certo "Perdido na noite" que a coisa tomou forma. Dustin Hoffman assumiria o icônico papel, mas não entendeu o "conceito" do filme após meses de discussões em torno da produção. Harrison veio como opção justamente por seu papel em Star Wars (inclusive, há uma referência ao filme, na cena que um comerciante de cobras que aparece em uma das ruas de  possui em sua testa uma tatuagem da nave Millenium Falcon ).

"Eu não sei porque ele salvou a minha vida. Talvez naqueles últimos momentos ele amava a vida que ele jamais teve. Não apenas a sua vida - a vida de ninguém, a minha vida. Tudo o que ele queria eram as mesmas respostas que o resto de nós quer. De onde foi que eu vim? Para onde vou? Quanto tempo eu tenho? Tudo que eu podia fazer era sentar lá e vê-lo morrer."

Olhos da alma...

Uma dos mais importantes elementos do filme são os olhos. A produção já começa com um olho, e através dele, vemos o inferno que a Terra se tornou. O próprio teste de replicante é feito através das reações do olhar, o que mostra a intenção do filme em entender os reais pontos de vistas dos personagens. Inclusive, quando os replicantes agem contra os humanos, eles atacam os olhos, mais uma vez, mostrando que sem eles, as experiências seriam abreviadas.


A primeira pessoa que Roy e Leon visitam é o fabricante de ...olhos dos replicantes. Os traços de humanidade nos replicantes (que ficam mais fortes ainda em Blade Runne 2049), sugerem que Tyrell não está errado em dizer que criou replicantes mais humanos que os humanos. Reparem como em várias cenas, o filme mostra replicantes fumando. Na época era sinônimo de prazer e humanidade.
E porque Roy salva Deckard no último instante?

Naquele momento, ele se coloca no lugar de Deus, e faz por ele o que gostaria que Deus fizesse pelos replicantes: permitir que vivam.

Obra prima irretocável, que ainda pode-se escolher qual corte preferir e qual rumo da história prefere acreditar.


"Eu vi coisas que vocês homens nunca acreditariam. Naves de guerra em chamas na constelação de Orion. Vi raios-C resplandecentes no escuro perto do Portal de Tannhaüser. Todos esses momentos se perderão no tempo, como lágrimas na chuva. Hora de morrer."


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