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PREDADOR: TERRAS SELVAGENS (2025) - FILM REVIEW

O Lobo Que Observa

Os mais jovens carregam o fardo do passado como se trouxessem nas costas uma pele ancestral, grossa, marcada, muitas vezes pesada demais para o corpo em crescimento. Vivem entre a vontade de correr livremente e o medo de romper o tecido das tradições que os cobrem. “As tradições são correntes que se disfarçam de raízes”, diz uma citação popular e talvez esteja aí a tragédia e a beleza dessa herança: o que nos prende também nos dá origem.

Há séculos, os anciãos do grupo definem o rumo da matilha humana. Eles conhecem o caminho, as histórias e os perigos. Mas, a cada nova geração, surgem olhos que enxergam além da névoa, ouvidos que se inquietam com o som do vento e bocas que ousam perguntar o que nunca deveria ser questionado. É nesse momento que o peso da tradição se torna luta: entre seguir o rastro dos que vieram antes ou abrir uma nova trilha na neve.

O lobo é uma boa metáfora para isso. Costuma-se dizer que o líder não é o que mais mata, mas o que sabe quando não matar. Ele guia não pela força, mas pela sabedoria de equilibrar instinto e silêncio. O verdadeiro alfa não impõe o medo, inspira o respeito. Entre os lobos, a liderança é cíclica, dinâmica; quem hoje guia, amanhã segue. É uma ordem natural que reconhece a importância dos mais jovens, pois são eles que têm fôlego para correr mais longe.

Mas no mundo dos homens, esquecemos disso. Os velhos lobos se recusam a soltar o posto. Temem o frio do anonimato e, por isso, os jovens são obrigados a lutar não só contra o inverno, mas contra o próprio bando. E, ainda assim, continuam, porque dentro deles queima uma fome diferente, não de poder, mas de sentido.

Nietzsche dizia que “é preciso ter caos dentro de si para gerar uma estrela dançante”. E talvez sejam esses jovens lobos, com seu caos, sua pressa e sua insubmissão, os únicos capazes de romper o círculo e reinventar a trilha. Pois não é na repetição do uivo antigo que a matilha sobrevive, é na coragem de cantar outro tom quando a floresta muda.

O peso das tradições arcaicas, afinal, não está apenas no que proíbem, mas no medo que cultivam. E talvez o novo líder, o verdadeiro, seja aquele que entende que o caminho não se impõe; apenas se aponta, e o resto é confiança.

No fim, o lobo mais sábio não é o que lidera a matilha, é o que sabe quando deixá-la seguir sozinha. E neste contexto, Predador: Terras Selvagens se torna o primeiro filme da franquia com algo, realmente, a dizer. Não só pelo tom de aventura pura, mas por um desencaixe, que inicia e termina a produção. Ela tira do gesso um dos protagonistas mais queridos da ficção, dá protagonismo a ele e o ensina a traçar seu caminho, mesmo que dentro de suas raízes e convicções.

Thia e Tessa 

Podemos pensar essa narrativa como uma reflexão filosófica sobre o que significa “ser humano”, um tema que atravessa desde a literatura clássica até a ficção científica moderna. A história de dois robôs de uma linha de montagem, dotados de consciência em graus distintos, oferece um espelho para nossas próprias contradições: o desejo de transcender a função e a aceitação da rotina como destino.

Um deles, Tessa, que apenas executa, representa a ordem, a previsibilidade e o propósito utilitário da existência. Ele é o eco da máquina perfeita: eficiente, sem hesitação, incapaz de perceber a própria prisão. É o filho direto da lógica industrial, da produção em série e da racionalidade que reduz tudo a tarefas. Thia, no entanto, é o erro do sistema, o desvio. Ao questionar o sentido de sua própria função, ele rompe com o determinismo da máquina e se aproxima do humano, não pela aparência, mas pelo conflito interno. A dúvida, afinal, é a centelha da consciência.

Esta diferença é realçada, principalmente, pela ausência de pernas, algo como se a vida tivesse quebrado a personagem e assim, traçando o caminho para sua humanização diante das limitações.

A relação entre ambas pode ser lida como uma alegoria do mito de Caim e Abel, ou de Prometeu e Epimeteu: um voltado ao cumprimento da ordem, o outro à rebeldia criadora. O robô que busca ser mais humano não se contenta com o simples “funcionar”; ele deseja “existir”. Sua irmã mecânica, ao contrário, a vê com estranhamento, talvez com uma mistura de piedade e incompreensão, porque não consegue conceber a necessidade de um “porque” além do “como”.

No fim, talvez o robô que busca a humanidade não queira exatamente ser humano, mas compreender o que há de humano em sua busca. E o outro, em sua perfeição funcional, pode representar o destino que os homens tentam negar: o de se tornarem máquinas previsíveis, incapazes de sonhar.

Assim, os dois robôs da linha de montagem são dois lados da mesma criação, o servo e o sonhador. Um é o reflexo da humanidade que constrói, o outro é o eco da humanidade que questiona. E entre eles, pulsa a pergunta que nem as máquinas, nem nós conseguimos responder plenamente: o que nos torna vivos, afinal?

E na união destes pensamentos, Thia e Dek ressignificam o que é "ser", além de apenas existirem dentro de suas respectivas culturas. 

Talvez escute dizerem que este é o melhor filme do Predador no cinema. Pura besteira. Este é o primeiro. 




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