MARCELO MIRANDA - RESPONDE ÀS 7 PERGUNTAS CAPITAIS
Marcelo Miranda nasceu em 12 de agosto de 1981 e construiu uma sólida trajetória no jornalismo cultural e na crítica de cinema. Formado em Jornalismo pela UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora) e com mestrado em Comunicação pela UFMG, atua como jornalista, crítico, repórter cultural e assistente editorial.
Com passagens por veículos como a Folha de S.Paulo, já escreveu, editou e revisou diversos textos jornalísticos e ensaísticos, além de colaborar com podcasts, atuar como professor e ministrar aulas nas áreas de crítica, cinema e comunicação. Também tem experiência em curadoria de festivais, mediação de debates e assistência editorial literária. Entre 2021 e 2023, foi presidente da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), entidade da qual é membro ativo.
1) É comum lembrarmos com carinho do início da nossa relação com o cinema. Os filmes ruins que nos marcaram, os cinemas frequentados (que hoje, provavelmente, estão fechados), as extintas locadoras de VHS e DVD que faziam parte do nosso cotidiano. Conte-nos um pouco de como é sua relação com a 7ª arte. Quando nasceu sua paixão pelo cinema?
M.M.: Não tenho um momento específico que delimite isso. Não existe, na minha cabeça, aquele instante mágico em que me descobri apaixonado por cinema. Simplesmente aconteceu. Tenho lembranças muito vívidas de assistir a filmes na TV ainda bem pequeno, de ganhar um videocassete e de frequentar videolocadoras com meu pai de criação, quando eu tinha uns 7 ou 8 anos. Ele alugava faroestes (bangue-bangue) para ele e, para mim, desenhos animados ou filmes dos Trapalhões.
Fui crescendo e continuei assistindo a filmes, e assim é até hoje. Sempre fui mais aficionado por leitura (literatura, quadrinhos, História), e o cinema era um complemento das minhas atividades fora da escola. Na verdade, até hoje leio tanto quanto, ou até mais do que, assisto a filmes. Mas foi no cinema que me especializei profissionalmente, embora ainda trabalhe com jornalismo literário.
2) Tyler Durden disse em Clube da Luta: "As coisas que você possui acabam possuindo você". Ser colecionador é algo que se encaixa neste conceito, já que você se torna escravo do colecionismo. Coleciona filmes, CDs ou algo relacionado à 7ª arte?
M.M.: Não me considero um colecionador. Tenho, e ainda compro, muitos filmes, livros, quadrinhos e revistas, mas nunca sistematizei, contabilizei ou organizei tudo de forma que pudesse ser chamado de coleção. Simplesmente adquiro aquilo que me interessa ter em casa, à disposição.
Jamais pago preços exorbitantes por absolutamente nada, sou totalmente contra qualquer tipo de especulação. Diria que possuo um acervo (bem vasto e variado) dessas coisas todas, com centenas de itens, em constante expansão. O colecionismo, propriamente dito, não é exatamente a minha prática.
3) Interessante como a vida dá voltas. Há cerca de 18 anos, você foi o primeiro jornalista a me entrevistar. Li a entrevista hoje mesmo (coloquei um trecho abaixo) e percebi como as coisas mudaram. Naquela época, eu ainda não era colecionador; tinha visto 11 mil filmes (hoje são quase 20 mil)....
O que mudou no Marcelo Miranda cinéfilo nesse tempo? Em que direção seu olhar sobre o cinema se desenvolveu?
M.M.: Lembro-me bem dessa entrevista. Eu era repórter de um portal de notícias em Juiz de Fora (MG) e cheguei até você por dica de um conhecido em comum (ele, sim, um colecionador alucinado!). Foi interessante porque a seção daquele portal era dedicada a perfis de pessoas interessantes, com boas histórias ou experiências, e, numa cidade como Juiz de Fora, o seu caso era bem incomum: uma pessoa dedicada a assistir a muitos e muitos filmes diariamente, com um viés de colecionador bem definido.
Na época, eu já escrevia sobre cinema há algum tempo, desde a faculdade de Jornalismo, que cursei entre 2000 e 2003. Naquele período, mantive com um grupo de amigos um site de textos sobre filmes chamado justamente Cinefilia.
Passei por alguns veículos de imprensa na cidade e, em 2006, me mudei para Belo Horizonte, onde expandi bastante minha atuação em crítica, pesquisa e cinefilia. Os anos como repórter e crítico no diário O Tempo foram fundamentais nesse processo, pois me permitiram circular por festivais, cabines, mostras e projetos nos quais até hoje mantenho boas relações, e que ainda me geram oportunidades de trabalho.
Com o “boom” da internet, comecei a colaborar com revistas virtuais como Cinequanon, Interlúdio e, atualmente, escrevo com orgulho para a Cinética, que considero a principal publicação de crítica de cinema do Brasil.
Consegui, assim, juntar o amor pelo cinema e pela cinefilia ao interesse por estudos, pesquisas, leituras e conversas sobre o assunto. De repente, me vi participando de curadorias de festivais, júris, editais, mesas de debate, pós-graduação, aulas, ou seja, uma caminhada efetiva não só na cinefilia (o ato de ver filmes com frequência), mas também na formação, análise, pedagogia do olhar. Faço parte, de certo modo, de um estado de coisas do cinema. E que assim continue.
4) "A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos". Considerando a reflexão, há alguma experiência vivida no meio artístico que foi especialmente marcante?
M.M.: Não sei exatamente a que experiência você se refere, se a um filme ou a um acontecimento, então vou citar os dois.
M.V.: Na verdade, é uma pergunta aberta mesmo. Algum momento em sua caminhada cinéfila que tenha sido muito marcante.
M.M.: Assistir a Psicose, do Hitchcock, ainda na adolescência, foi uma experiência profundamente marcante. Revelou-me caminhos do cinema que eu até então desconhecia. Até hoje, é o filme que mais vezes revi na vida, foram dezenas de vezes, embora eu considere Um Corpo que Cai o melhor trabalho do Hitchcock.
Outra experiência marcante, desta vez no sentido profissional, foi ter ido ao Festival de Cannes em duas ocasiões (2010 e 2012). Ainda que não tenha nada daquele glamour que a mídia costuma propagar (pelo menos não para quem cobre o evento como jornalista), estar naquele ambiente, assistir aos filmes daquela forma e participar, ainda que discretamente, de todo aquele “carnaval” tem seu impacto. Acima de tudo, é uma grande diversão.
5) Com relação às suas preferências cinematográficas, há uma lista dos filmes de sua vida? Um Top 10 ou mesmo o filme mais importante?
M.M.: Já fui muito mais adepto de listas do que sou hoje. Atualmente, fujo delas, especialmente quando me pedem. E vou fazer isso de novo aqui! (risos). Mas posso citar, de cabeça, alguns filmes que, quando vi pela primeira vez, mexeram comigo a ponto de me fazerem olhar para o cinema de outro jeito. Não são os meus “melhores filmes”, nem uma lista ordenada, nem preferências absolutas.
São apenas obras que causaram algum tipo de impacto importante na época em que as vi: Psicose (Alfred Hitchcock), Três Homens em Conflito (Sergio Leone), Rio 40 Graus (Nelson Pereira dos Santos), 2001: Uma Odisseia no Espaço (Stanley Kubrick), Prelúdio para Matar (Dario Argento), India Song (Marguerite Duras), À Meia-Noite Levarei Sua Alma (José Mojica Marins).
6) Fale um pouco sobre os seus próximos projetos.
M.M.: Meu projeto é continuar trabalhando com cinema sob todas as formas possíveis, exceto a realização, que está um pouco fora dos meus horizontes. Recentemente, defendi meu mestrado com um estudo sobre Cavalo Dinheiro, do Pedro Costa, e penso em seguir para um doutorado, provavelmente com foco em cinema brasileiro. Quero continuar atuando com crítica, curadoria, pesquisa, debates e aulas, que são atividades que adoro. E, claro, seguir vendo muitos filmes e lendo, lendo cada vez mais.
7) Ao olhar para sua trajetória, qual aprendizado considera mais valioso e gostaria de compartilhar?
M.M.: Espero que eu ainda tenha muita vida pela frente para, quem sabe um dia, me arriscar a dar alguma lição de vida!
M.V.: O que, por si só, já é uma bela lição. Obrigado, amigo. Nos vemos por aí...