MONIQUE LAFOND - RESPONDE ÀS 7 PERGUNTAS CAPITAIS
M.L.: Eu comecei minha relação com o cinema por volta de 1967 com a peça "Os Pais Abstratos" do Pedro Bloch e aí fui chamada para fazer o filme do Flávio Tambellini (pai), "Até que o Casamento nos Separe". Eu era de menor e não vi o filme. Eu trabalhei com o filho dele, que hoje é também diretor e cineasta, e ali começou minha trajetória no cinema. O meu lance com cinema foi profissional. Foi fazer cinema.
No meio da minha carreira, comecei a perceber o quão difícil era um filme brasileiro se pagar no nosso próprio país. Acompanhei muitos cinemas fecharem e se tornarem igrejas. Foi atuando em filmes dos Trapalhões que fiquei mais por dentro deste lado financeiro. O filme não se paga aqui. Ele só consegue ser pago quando se vende, comercializa, enfim, eu trabalhava muito para perceber certas coisas acontecendo.
Há mais de 20 anos eu dou aula de teatro, desde as crianças até alunos de 90 anos. Eu me dedico muito. É um trabalho árduo. Dar aula para quem sabe é fácil, mas para iniciantes é difícil demais, mas é gratificante. É uma troca muito rica. Mas nesta caminhada eu não assisti muitos filmes. Eu cheguei a fazer 3 filmes por ano. Era um trabalho que consumia muito. Você fica muito em função do filme que está sendo feito, geralmente em locação, longe de sua residência, então não dava muito tempo para ir a uma locadora.
Eu adorava uma que tinha perto da minha casa, a Paradise Vídeo. Era uma locadora bem cult, que tinha todos os filmes brasileiros, espanhóis, franceses, italianos e quando ela fechou, há uns 5 anos, foi uma tristeza, mas sabemos que tudo está acabando, como os CDs e outras mídias.
Mas o cinema sempre foi um fascínio porque é muito difícil de fazer. É um trabalho técnico. Você não pode perder a emoção. Se você for para casa e brigar com o marido, no dia seguinte tem que estar com aquela mesma energia do dia anterior. E, como não fazemos em ordem cronológica, é difícil. E, por falta de equipamentos, os filmes eram dublados depois, então era trabalhoso. Eu amo fazer cinema. Aí o Fernando Collor entrou, retirou a galera que faz cinema e ficamos 10 anos sem fazer e para retornar foi muito difícil, porque entramos em outra geração, então fui seguindo na TV e teatro.
2) Com relação às suas preferências cinematográficas, há uma lista dos filmes de sua vida? Um Top 10 ou mesmo, o filme mais importante?
M.L.: O filme que mais mexeu comigo, com minha personalidade, com tudo, foi "Eu matei Lúcio Flávio". Eu não seria a atriz do filme, mas ela teve um problema de última hora e me chamaram para substituí-la. Foi um papel dificílimo, e com ele ganhei o prêmio Air France de melhor atriz (O prêmio Air France é um prêmio de cinema criado em 1967 pela companhia aérea Air France para premiar os melhores do cinema nacional, escolhidos por um júri formado por críticos e estudiosos de cinema). Eram cinco as categorias premiadas: filme, ator, atriz, diretor e prêmio especial do júri.
Aos 26 anos, concorrendo com Fernanda Montenegro por "Eles não usam black-tie". Fiquei muito emocionada por receber aquela homenagem. Foi uma construção de personagem bem complexa. Peguei várias nuances de experiências de vida de amigos e histórias que conhecia. Em compensação, eu e o Anselmo Vasconcelos, que também foi premiado naquele ano por "República dos assassinos", ficamos desempregados 8 meses, e ficávamos nos ligando para ver quem conseguia uma oportunidade para chamar o outro.
Foi engraçado e triste ao mesmo tempo. Era uma época ruim, e a profissão ganhava mal. Uma premiação como esta não garantia o pé de meia, como acontece hoje em dia.
Como foi atuar nesta obra tão importante para nosso cinema, de um autor único, numa época em que a censura "corria solta"? E o que o papel representou na sua carreira?
O elenco era com 7 crianças, e eu era a terceira. Fui praticamente arrastada para o teste pela minha mãe, que insistiu para eu me tornar alguém que ela provavelmente queria ter sido. Mas acabou dando certo, porque eu adorei. Como eu disse anteriormente, fiz a seguir a peça “Os Pais Abstratos”, de Pedro Bloch, com Glauce Rocha, Darlene Glória e Jorge Dória. Foram 2 anos em cartaz com esta peça.
4) Algumas profissões rendem histórias interessantes, curiosas e às vezes engraçadas. E certamente, quem trabalha com cinema, tem suas pérolas. Se lembra de alguma história divertida que tenha acontecido durante a execução de algum trabalho seu e que possa compartilhar?
M.L.: Trabalhar com Walter Hugo Khouri foi um dos presentes que ganhei na carreira, porque eu nasci numa época que me proporcionou estar dentro de suas produções. Um dos filmes foi defender o Brasil no festival de San Sebastián, na Espanha, chamado "Paixão e sombras", com a Lílian Lemmertz, e quando eu estava lá, num castelo maravilhoso, vi Alain Delon e Claudia Cardinale. Foi inesquecível. Khouri era um elegante diretor, mesmo expondo as mulheres em seus filmes como ele fazia, as cenas não eram vulgares.
Era como se fosse um quadro e nós fizéssemos parte daquilo. Ele sempre buscava um olhar diferente, um ângulo diferente. Gostava de filmar a nuca das mulheres. Walter era uma pessoa muito educada, fugindo um pouco do que estávamos acostumadas. Uma pena que ele se foi.

Outro que adorei ter trabalhado foi o Carlos Hugo Christensen, que eu fiz "Enigma para demônios". Também fui indicada a prêmio pelo filme, mas uma curiosidade, fui dublada por outra atriz, já que eu tinha a voz de menina na época. Acho que foram a Norma Blum e a Diana Morel, porque eu fazia dois papéis. Na época, não me avisaram que eu não seria chamada para a dublagem. A gente, para assinar contratos, vendia a alma e não pensava no amanhã.
Fiz também muitos filmes ruins, alguns dos quais nem sei o nome. Mas tudo foi aprendizado. Eu fui pegando noção de enquadramento, me aplicava bastante no personagem, mesmo com roteiro ruim, eu fazia minha parte. Eu defendia minha personagem da melhor forma possível.

Um filme de que gosto muito é "Moças daquela hora", que foi o primeiro que protagonizei, com direção do Paulo Porto. Eu fazia uma menina de Minas e um detalhe: eu era virgem nesta época!!! E a personagem também era. Eu perguntei ao diretor como eu faria uma cena de amor. Ele me respondeu: "- Imagine que você está comendo uma caixa de chocolate." Rimos muito disto. Mas sempre fui muito respeitada no set.
Uma história curiosa é sobre um fã. Ele me escrevia cartas. Muitas por mês, me elogiando, mas nas cartas tinha o holerite e extrato da poupança, dizendo que tinha dinheiro para casar comigo. Era até ingênuo, mas engraçado.
5) Imagine o cenário: você é uma atriz (de qualquer país) enquanto ela atua em um filme memorável. Qual seria a atriz, o filme e claro… por quê?
M.L.: Um filme que eu gostaria de ter feito: À Meia-Luz (1944). Tentei até trazer a peça para o Brasil. Um filme maravilhoso. O Rubens Ewald Filho até me mandou uma cópia na época, que tenho até hoje.
6) Fazer cinema envolve muitas variáveis. Esforço, investimento, paixão, talento... E a sinergia destes elementos faz o resultado. Qual trabalho em sua carreira considera o melhor?
M.L.: O trabalho que me deixou profundamente realizada foram aqueles papéis que saem do formato original, que engessam a gente. O artista pode engordar, emagrecer, pintar cabelo, se "enfeiar", ou seja, não existe esta de não se encaixar no perfil do personagem. Isto é uma forma dos diretores de elenco trabalharem menos, já que, para poupar trabalho, buscam um perfil de acordo com o personagem. Até hoje isto acontece.
Fiz um filme chamado Lara, dirigido por Ana Maria Magalhães, sobre a vida da Odete Lara. A composição do personagem foi maravilhosa. Há uma cena em que eu me jogo dentro de um poço. Ninguém me reconheceu depois. Me deixou muito orgulhosa.
Fiz também uma bruxa no teatro. Uma peça infantil dirigida por Walcyr Carrasco. As crianças morriam de medo e os adultos não me reconheciam. Eu adorava.
M.V.: E, em contrapartida, o que você mais se arrependeu de fazer, ou, caso não tenha se arrependido, teria apenas feito diferente?
M.L.: Não me arrependo de nada, pois plantei muito, até com os erros, e colhi.
7) Para finalizar, deixe uma frase ou pensamento envolvendo o cinema que representa você.
M.L.: Não me vem nenhuma na cabeça. Mas vou te dizer o que mais me orgulha: é tirar o depressivo de casa, a pessoa que tem pressão alta, pessoas com problemas de comunicação, de iteração e conseguir fazer uma turma de pessoas com um objetivo de fazer teatro.
E ver no dia a dia elas melhorarem a saúde, produtividade, memória porque o teatro é bom para a vida.
M.V.: Obrigado pela entrevista. Sucesso para você.
